A nossa terra é essencialmente a terra e as suas coisas. Pensar
na nossa terra é também pensar nessas coisas, que sobre ela, a povoam. Principalmente
porque fazemos por acreditar que nem a terra
existe mais sem as suas coisas, nem
as suas coisas existem numa outra terra. Assumindo isto, natural seria supor
que há aqui uma qualquer harmonia, não fosse esta ilusão atormentada pela
constatação de que já não percebemos que
raio conduz tudo isto. Dar conta que há uma espécie de sarna que vai infestando a delicadeza da pele da nossa terra com estranhas coisas fungosas e que pelo coçar
do tempo vai dando cabo daquelas por que sentíamos apreço.
Um incómodo que aparentemente pouco importa, porque na realidade
nunca ninguém nos perguntou o que achávamos do que quer que fosse. E
provavelmente se tivessem perguntado, responderíamos interrogando para quem
essas novas coisas… Para quem
queremos novos equipamentos comerciais, desportivos ou de lazer quando não temos
a mínima consolidação de uma estrutura de mobilidade urbana… para quem queremos
novas áreas urbanizáveis (que nem baldios onde agora brotam cogumelos exóticos da terra) quando as
áreas habitadas estão destruturadas, dispersas… para quem queremos novas
habitações quando em seu lugar poderíamos ter uma política activa de fomento à
reabilitação das já existentes – cuja ruína vai contribuindo para que o
conjunto das coisas cá da terra se
assuma decadente.
O que é certo, é que o afastamento das populações na discussão
sobre estas coisas, dirigido pelo Poder e seus representantes cá na terra,
acaba por funcionar também como inibidor da própria vontade das populações em
querer fazer parte, intervir e decidir. Agrava ainda a constatação de que hoje
o poder local pouco mais é que um simples balcão onde se vai carimbar uns
formulários, que pela brutal e constante redução das verbas para o seu
funcionamento lhe deixa muito pouco espaço para a promoção de políticas de
interesse público.
Há no entanto um espaço que se mantém em potência! E é neste
espaço que devemos agir e exigir ao executivo camarário uma outra política
urbana e arquitectónica: (1) por uma democracia participativa que inclua as
populações nos processos de decisão, projecto e realização; (2) pela criação de
equipas multidisciplinares de acção directa, de forma a se proceder a
levantamentos sociais e físicos do território para um real conhecimento das necessidades
e potencialidades da região, das suas identidades e idiossincrasias, permitindo
um apoio prático e teórico abrangente, vital para o planeamento estratégico,
consequente ordenamento do território e revitalização da economia e do contexto
e tecido produtivo.
A Arquitectura como resposta social mas também como serviço
público essencial pressupõe, pois, uma acção integrada entre os técnicos e as
populações – encarando o técnico como agente determinante e como factor de
progresso, que ultrapasse a figura do fiscal
ou regulador ‘colado’ ao poder político. Trata-se, no fundo, da necessidade da
inclusão das populações no processo discussão sobre o Território, sublinhando a
necessidade de se consagrar o direito, que a cada um de nós assiste, à
Arquitectura: ou seja, ao espaço arquitectónico e paisagístico de qualidade,
contrariando o seu já longo processo de exclusão.
Diogo Silva
publicado no Notícias de Ourém de 26/6/2014
Mais uma excelente colaboração. A mostrar que há gente cá da terra que sabe das coisas e que quer fazê-las. Dá mesmo gosto ler e dói as dificuldades que se sentem de fazer melhores as coisas da nossa terra.
ResponderEliminarAbrações