Ti Alice do Carvalhal ficou viúva com cinco
filhos às costas e fez das tripas coração para chegar aos setenta e sete anos
que agora completou. Para assinalar o feito convocou os herdeiros diretos,
dispensando netos, noras e genros, e fez uma panelada de chícharos.
A mais nova, professora, anda revoltada e
deprimida com o que está a acontecer nas escolas. Os irmãos acham que ela era
uma privilegiada e acham muito bem que a obriguem a não gostar do que faz.
O segundo mais novo é operário e anda preocupado
porque é voz corrente que a empresa vai ser deslocalizada. Os irmãos acham
natural e que a culpa é dele porque estava acomodado ao dinheirinho certo ao
fim do mês e nunca se esforçou por fazer outra coisa.
A do meio tem um “comes e bebes” mas a coisa
vai de mal a pior porque a malta não tem dinheiro. Os irmãos sempre acharam que
ela escolhera aquela vida porque não dava trabalho e que puxava nos preços
quanto queria e, por isso, as suas dificuldades não os comovem.
O segundo mais velho anda na construção e
anda desanimado porque a coisa vai torta. Os irmãos acham que ele quase que
chegava a rico sem saber ler nem escrever e que é bom que se convença que não
tem pinta para ter um mercedes cinzento.
O mais velho é criador de gado e, com o que
lhe vão exigindo, vai ter de fechar a exploração. Os irmãos concordam porque
não lhes agrada o cheiro que, às vezes, anda no ar e porque, além disso, ele dá
medicamentos aos porcos.
- Vocês parece que se esqueceram que
precisam uns dos outros! Não foi para ver isto que eu vos andei a criar! Fazem
lembrar-me os do governo que atacam tudo a torto e a direito, convencidos que a
única coisa que funciona bem neste país é a governação! Estais angustiados
porque vos convencestes que o vosso mal era o bem dos outros e que ficaríeis
bem se os outros ficassem mal!
Pois eu preciso de vós os cinco. Deixei de
fazer queijos pelo facto de me exigirem azulejos e uma retrete – por que raio é
que eles acham que para fazer queijos é preciso uma retrete?! - e fiquei
conformada com a reforma mínima! Agora vejo que errei, devia ter lutado contra os
poderosos e acomodei-me! Agora peço-vos que me ajudem, quero 50 euros de cada
um como prenda de anos!... Em quem vais votar?
- Eu nunca votei!
- Eu nunca mais voto!
- Votar, para quê?
- Com o meu voto, ninguém conte!
- Eu voto na puta que os pariu!
- Puta que os pariu aos cinco! Querem ver
que tem de ser a velha a votar por vocês todos! ! Quem não vota, consente! Em quarenta
anos de votos nunca tive tanta vontade de votar! Vou votar sim! E desta vez vou
votar na CDU! Vou votar contra os bandos de soares e de cavacos que há trinta e
tal anos que nos andam a vender europa e vai a ver-se o que venderam foi o
país. Vou votar porque acredito que não é com esta cambada de vaidosos “adoutorados”
e “endinheirados” que se resolve a crise mas sim com aqueles que há anos que
avisam o povo que quanto mais desta europa, pior deste país!...
De saída, os cinco trocaram entre si umas
palavras: se a gente nem dinheiro tem para a pôr no asilo, o melhor é votar
como ela diz!...
texto que não foi publicado no Notícias de Ourém de 16/5/2014
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