Cresci no meio da esperança. Abril
estava ainda fresco, muito embora – sei-o
hoje – já com as traições Barreto/Soares/Cavaco em marcha. Lembro-me das palavras ternas, lá em casa, quando
se pronunciavam as conquistas, os avanços, as esperanças… sempre as esperanças.
Das poucas vezes que vi água nos olhos
ternos do meu pai, foi ao falar (gritar ternura?) da Reforma Agrária no mais sublime slogan que a justiça usa para
se vestir no alfabeto: «se lhe dás sangue e suor é justo que te
pertença!» . Eram tempos de alento, de meiguice, de infância, é
certo (minha e da Revolução), mas de tremenda alegria, como sempre são os Homens
Povo quando sentem o destino nas mãos.
Lembro-me do meu pai ir mostrar-me
Coimbra, a Universidade, sabendo que agora estava ao alcance de todos, pois
Abril era a alegria universal.
Lembro
slogans pintados nas paredes caiadas do sul (atravessado a cumprir o
direito às férias que só Abril soube!) « Casas caiadas e pão!», e as letras
dos coros alentejanos reforçando a certeza de melhor velhice, na assistência
inaugurada com as UCP – que também trouxeram as primeiras creches (e o pleno
emprego, e o pão, e o pão e o pão…).
Tive uma infância saborosa, nas
guloseimas que a avó Mimi comprava com a pensão de sobrevivência que Abril lhe
outorgou. Bebi dos pacotinhos de leite
que Vasco Gonçalves obrigou nas escolas para colmatar as carências das
infâncias . Os médicos (e até palhaços,
sabiam?) visitaram-nos na escola primária para que a geração de Abril não
soubesse do trabalho ainda meninos nem
das doenças que nenhuma infância merece.
Vi velhos aprenderem a ler. Soube da
garantia do salário mínimo. Vi crescer escolas, hospitais, saneamento básico,
electrificação das aldeias, centros de
saúde, creches e o jardim infantil onde,
montado em cavalos de ferro, sonhei um
Abril ainda maior, estendendo a sua alegria a todos os meninos do mundo.
Hoje, vendo sofrer um país real em
nome de um país só visto pela especulação do neo-fascismo capitalista, vendo
amigos e irmãos a abandonar a sua terra, assistindo à entrega da nação ao imperial interesse dos agiotas,
rememoro tempos contados de espancamentos, torturas, fomes. Abril está longe.
Mas mesmo na noite mais triste….
António Lains Galamba
in Notícias de Ourém, 5 de Abril 2014
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