terça-feira, 15 de julho de 2014

A Assembleia Municipal e a nossa saúde

Vive-se o ano do 40 º aniversário do 25 de Abril. Não espanta, por isso, que haja quem o queira celebrar e que haja quem, raivosamente, bolse enormidades que não resistem à mais superficial análise da História e revelam primário anti-comunismo. O 25 de Abril veio trazer, depois de um período de alguma euforia, a possibilidade de as massas, com 4 governos provisórios ao seu serviço, encetar um outro e novo caminho para Portugal. Foram 400 e poucos dias em que se conquistaram direitos do homem. Autodeterminação dos povos, condições de trabalho dignas (contratação colectiva equídea, salário mínimo, reformas, férias), direitos à educação e à saúde, consagrados por declarações universais (de 1789 e de 1948), por instâncias das Nações Unidas como as Organizações Internacional do Trabalho e Mundial de Saúde, e que consagrados foram por uma Assembleia Constituinte formada através de verdadeiramente impressionantes eleições de um povo em crescimento embora, naturalmente, carente de informação e formação política, fortemente pressionado por quem mantinha poder e via interesses egoístas seus atingidos pelo rumo das coisas. Mas foi expressa a vontade popular e teve como resultado uma Constituição que, aliás, já sofreu 7 revisões.

Desde 1976, são 38 anos em que, governo a governo, desde o 1º constitucional, tem prevalecido a política de destruição, pouco a pouco, do muito que foi conquistado em 400 dias e uma Constituição. Apenas como caminho aberto. Mas a essa política revanchista se tem resistido. E continuará a resistir!
Na última Assembleia Municipal, por portas travessas, sentimos esta evolução de 40 anos de História. Dissemo-lo a propósito da saúde, do Serviço Nacional de Saúde, da nossa saúde, que “espíritos santos” e quejandos querem que seja um negócio e não um direito.

Assim o dissemos. O que estava em causa, então – com manifestações de utentes nos 4 hospitais do distrito – era a portaria 82/2014. Trata-se de portaria que visa classificar as instituições hospitalares e serviços do SNS. Após leitura atenta, o que se pode concluir é que se está perante um instrumento de intervenção na rede hospitalar que visa três grandes objectivos:
- desinvestir nos cuidados de saúde hospitalares;
- dificultar drasticamente o acesso à prestação pública de cuidados;
- viabilizar as unidades de elevada tecnologia do sector privado.

Segundo a portaria, criar-se-iam 4 grupos de hospitais e instituições, hierarquizados por valências, do nível I (com valências mínimas) ao nível IV (com especialidades muito específicas). O que se concretizaria em simultâneo com a aplicação dos chamados “centros de referência”. Não se põe em causa a existência desses centros, nem a necessidade de se definir a tipologia dos serviços e estabelecimentos do SNS. Mas o que os dois documentos visam é a destruição do SNS tal como ele está consagrado constitucionalmente. E contribuirão para o processo de desertificação em curso.

O Centro Hospitalar do Médio Tejo (Abrantes, Tomar, Torres Novas), o Hospital de Santarém, os vizinhos Centro Hospitalar de Leiria-Pombal e do Oeste, bem como os da Cova da Beira e as Unidades Locais de Saúde de Castelo Branco e Norte Alentejano seriam integrados no Grupo I. Por isso, especialidades do Grupo II (oftalmologia, pneumologia, cardiologia, reumatologia, genecologia/obstetrícia e por aí fora) só passariam a poder ser encontradas nos Hospitais de Almada, Évora, Lisboa, Coimbra!
A título de exemplo, nas 24 maternidades a encerrar estão as 4 dos hospitais que poderiam, pela proximidade, servir a população de Ourém, enquanto se prevê a criação de maternidades privadas para proporcionar lucros chorudos pelo acto de nascer. E, entretanto, a evolução demográfica é… assustadora

Face à situação, e tendo esgotado o tempo, o eleito pela CDU propôs uma moção, redigida por forma a merecer apoio independente do possível desacordo com considerandos que a antecedem, Segundo essa moção, a AM manifestava-se veementemente contra a aplicação da portaria e recomendava ao executivo a interposição de uma providência cautelar.
A moção foi aprovada sem votos contra, com a abstenção de 7 membros do grupo PSD e de 3 do CDS.

Pela nossa rica saúde!
Sérgio Ribeiro
publicado no Notícias de Ourém de 10/07/2014

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